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UFF - Universidade Federal Fluminense

Animal – estar

De 08/11/2017 a 14/01/2018

 

A Galeria de Arte do Centro de Artes UFF apresenta animal-estar, exposição que reúne a produção das artistas Camila Soato, Julia Debasse, Milena Travassos e Raquel Nava, com curadoria de Icaro Ferraz Vidal Junior. Produzidas em diversos meios - pintura, pirografia, fotografia, vídeo, objeto e instalação – as 34 obras apresentadas abordam o tema da animalidade sob perspectivas que dialogam com o conceito animal-estar, forjado pelo filósofo francês Jacques Derrida.

O conceito:

“Frequentemente me pergunto, para ver, quem sou eu – e quem sou eu no momento em que, surpreendido nu, em silêncio, pelo olhar de um animal, por exemplo os olhos de um gato, tenho dificuldade, sim, dificuldade de vencer um incômodo”. Os bestiários que povoam a arte e a filosofia parecem resultar de uma tentativa de dar forma a este incômodo, enunciado por Jacques Derrida em O animal que logo sou. Eles emergem na cultura como um direcionamento ou um sintoma disso que o filósofo chama de animal-estar – “experiência original, única e incomparável deste mal-estar que haveria em aparecer verdadeiramente nu, diante do olhar insistente do animal”.

Os animais não se sabem nus. A vergonha neste encontro é toda nossa e se dobra sobre si na medida em que rapidamente se transforma em vergonha de sentir vergonha. Ao mesmo tempo, o olhar do animal oferece (ou impõe) ao humano uma brecha através da qual seu próprio fim, o inumano, o a-humano dá-se a ver. Passado este momento desestabilizador de confronto com o olhar do animal, tendemos a nos afirmar como seu contrário, limpando-nos de toda animalidade e tornando-nos capazes de falar dele, de domesticá-lo, enfim, de fazer dele um instrumento. Somente uma espécie inacabada como a humana poderia desenvolver tamanho controle sobre o Outro, cuja pluralidade trata de aplainar ao adotar o substantivo masculino singular, genérico, para falar do animal.

Na tradição do pensamento filosófico ocidental, nos diz Derrida, muitos pensaram o animal. No entanto, ninguém – nem Descartes, nem Kant, nem Heidegger, Lacan ou Levinas – se viu visto pelo animal ou, se tal incômodo foi experimentado, não foi incorporado ao pensamento. Nesta relação da filosofia com o animal, este desempenha o papel de um teorema: ele é visto mas não vê. Mas há ainda uma outra forma de relação com o animal, que pode ser encontrada nos poetas e nos profetas que tomam para si “a destinação que o animal lhes endereça” – o animal que anuncia a chuva, o animal que pressente a morte... A animalidade na produção das artistas Camila Soato, Julia Debasse, Milena Travassos e Raquel Nava assume formas muito diversas, mas em todas elas a relação com o animal parece ter sido aprendida com estes poetas e profetas.

Como bem observou a crítica de arte Paula Braga, as telas beges e sujas de Camila Soato acolhem sua busca pela animalidade – cuja síntese mais bem acabada encontra-se no cachorro vira-lata – do humano. Mas para além da presença reconhecível de figuras animais que copulam, lambem-se e cheiram-se nas telas de Soato; a fuleiragem, conceito a partir do qual a artista pensa sua produção, excede o conteúdo de suas representações e impregna seus gestos, sua falta de modos, que se manifesta, por exemplo, nas manchas que deixa ao limpar suas mãos na tela.

A animalidade é também recorrente em várias fases da produção de Julia Debasse. Em uma de suas série mais recente, vemos animais que convivem com órgãos vitais humanos ou, para sermos mais precisos, animais que habitam o humano. Tais órgãos destacam-se do corpo e adentram, com centralidade, o espaço em branco da folha de papel, remetendo-nos aos atlas biológicos. Diversos animais percorrem pulmões, útero, bexiga, coração, cérebro, rim... cada um em seu respectivo habitat, atualizando as metáforas que equacionam os vários humores que nos constituem aos instintos animais.

Milena Travassos encarna, ela própria, em suas performances, videoinstalações e fotografias, um modo de existência animal. Não representa um animal que lhe seria exterior mas ativa, na relação de seu corpo com o espaço, a espreita, o presságio e o assombro. Trata-se de uma poética que lança mão de elementos familiares – a lente de aumento, o arquivo, o interior de uma casa, a peruca – para construir uma atmosfera tensa, onde o suposto abismo que separa o humano do animal mostra sua artificialidade.

As fotografias e esculturas de Raquel Nava resultam de sua pesquisa sobre a interação entre animais e espaços urbanos e sobre a justaposição entre a natureza e seus simulacros. A artista observa que objetos de uso cotidiano onde verificamos a presença animal – chaveiros de pé-de-coelho, estolas de raposa, espanadores de penas de avestruz – estão sendo progressivamente substituídos por elementos sintéticos que, no entanto, frequentemente apresentam formas que imitam a matéria orgânica – vide a proliferação de estampas de zebras, onças e cobras. Ao articular estes elementos, Raquel Nava produz uma série de naturezas mortas que podemos ler como inventário e como genealogia desta esquiva, pela cultura, ao animal-estar.

Ao apresentar ao público do Centro de Artes de UFF a produção destas quatro artistas, reunidas a partir da ressonância em suas obras do inquietante conceito de animal-estar, de Jacques Derrida; esperamos adensar as reflexões contemporâneas - estéticas e políticas – sobre a animalidade. Além disso, é claro, a exposição animal-estar consiste em uma oportunidade de apresentar ao público da cidade de Niterói esta vigorosa produção, feita por artistas que não têm medo do animal.

Galeria de Arte UFF
Inauguração 08 de novembro de 2017
Quarta - 19h
Visitação até 14 de janeiro 2018
Domingo a sexta 10h às 22h, sábados 13h às 22h

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